Nos corredores do hospital público Joaquín Sorolla, o tempo mede-se em batimentos cardíacos e cada segundo é uma batalha contra a morte. Este é o cenário de alta pressão onde uma equipa médica apaixonada se dedica a salvar vidas — um ambiente sobrecarregado onde as tensões profissionais e os romances proibidos se entrelaçam, acelerando o ritmo cardíaco tanto dos protagonistas como dos espectadores. Após uma primeira temporada que estabeleceu este universo de urgências constantes, a série criada por Carlos Montero, responsável pelo fenómeno global “Elite”, regressa para uma segunda temporada que promete não só retomar as tramas pendentes, mas também elevar a fasquia a um nível sistémico e pessoal sem precedentes.
A confiança da Netflix no projeto foi tão excecional que a renovação para uma segunda temporada foi anunciada em junho de 2024, dois meses antes da estreia mundial da primeira. Esta decisão, pouco comum na indústria, não foi um mero cálculo comercial, mas sim uma declaração de intenções que concedeu à equipa criativa uma liberdade narrativa fundamental. Ao garantir a continuidade da história desde a sua conceção, permitiu-se aos argumentistas, liderados por Montero, construir arcos narrativos a longo prazo e, de forma crucial, abordar sem receio de um cancelamento prematuro o espinhoso debate social que se tornará o cerne da nova temporada. A confirmação oficial do início das filmagens em dezembro de 2024 consolidou este futuro, validando uma estratégia que apostou no prestígio do criador, num elenco de estrelas e num género de apelo universal.
O sucesso subsequente da primeira temporada, que se manteve durante cinco semanas no Top 10 global de produções de língua não inglesa da plataforma, com mais de 16 milhões de visualizações, apenas reforçou esta aposta ousada. Agora, a segunda temporada chega não como uma reação ao sucesso, mas como o culminar de um plano concebido com a segurança de poder ser mais ambicioso e crítico. Novos conflitos, dilemas éticos e personagens disruptivas estão prestes a alterar o frágil equilíbrio do Joaquín Sorolla, levando ao limite uma equipa que já caminhava na corda bamba.
Novas Adições e Rostos Conhecidos: O Elenco Expande-se
A nova temporada não só aprofunda as vidas do pessoal já conhecido do Joaquín Sorolla, como também introduz novas peças no tabuleiro, cujo design parece meticulosamente calculado para catalisar o conflito central. A escolha do elenco para esta segunda temporada não é aleatória; é uma ferramenta narrativa para materializar a tensão ideológica que definirá os próximos episódios.
A estreia de Pablo Alborán como o cirurgião Jon Balanzetegui
A adição mais mediática é, sem dúvida, a do cantor Pablo Alborán, que faz a sua estreia como ator num papel de grande impacto. Alborán interpretará Jon Balanzetegui, um novo cirurgião no hospital. Longe de encarnar um herói de bata branca, a sua personagem foi descrita como um “cirurgião narcisista” e um “galã egoísta”, projetado especificamente para gerar atrito, tensão e disputas de poder dentro da equipa médica. A sua chegada representa a personificação do individualismo e da ambição pessoal, valores que contrastam diretamente com o idealismo de personagens como o interno Biel ou o forte compromisso social do oncologista Néstor.
O próprio Alborán falou sobre a seriedade com que abordou este novo desafio profissional, declarando-se “um aluno muito bom” e destacando o seu interesse em “entender claramente onde estava a chegar” e o impacto que “a chegada de Jon provocaria” na dinâmica do hospital. A sua personagem, portanto, não é uma simples adição para criar tramas românticas, mas o catalisador de um choque de valores a nível profissional e ético.
A chegada de Rachel Lascar como a oncologista Sophie
Juntando-se a Alborán, a atriz Rachel Lascar entra para o elenco no papel de Sophie, uma “oncologista brilhante e disruptiva” cuja chegada promete “revolucionar o destino do hospital e daqueles que nele trabalham”. O seu perfil como especialista de prestígio coloca-a no epicentro de uma das tramas mais importantes: a luta da presidente Patricia Segura contra o cancro e o debate sobre o acesso a tratamentos de ponta.
A personagem de Sophie encarna a dupla face da saúde de elite: a promessa de excelência médica e inovação, mas também o perigo de criar um fosso entre “cidadãos de primeira classe” e o resto da população, como apontou a atriz Najwa Nimri. A sua especialidade, a oncologia, liga-a de forma direta e pessoal à trama política da presidente, tornando-a uma figura-chave que personifica as consequências das decisões tomadas pelo poder.
O regresso da equipa principal
Para ancorar estas novas tensões, a série conta com o regresso do seu sólido elenco principal. Os espectadores reencontrarão as vidas complexas de Najwa Nimri como a presidente Patricia Segura, Aitana Sánchez-Gijón como a chefe de Cirurgia Pilar Amaro, Blanca Suárez no papel da cirurgiã Jésica Donoso, Manu Ríos como o interno Biel de Felipe, Borja Luna interpretando o dedicado oncologista Néstor Moa e Alfonso Bassave como o diretor do hospital, Lluís Jornet.
Ao lado deles, regressa o ecossistema de personagens secundárias que dão vida ao hospital, incluindo Ana Rayo (Leo), Xoán Fórneas (Quique), Macarena de Rueda (Rocío), Marwa Bakhat (Mayda), Abril Zamora (Neus) e Blanca Martínez (Blanca). A este elenco consolidado juntam-se também para a nova temporada os atores Claudia Traisac e Gustavo Salmerón, completando uma equipa coral que entrelaçará tramas profissionais e pessoais com uma intensidade renovada.
Vidas no Limite: Os Arcos Narrativos da Segunda Temporada
A segunda temporada de “Respira” usa os dramas pessoais dos seus protagonistas não como histórias isoladas, mas como um microcosmo que reflete, de diferentes perspetivas, o conflito central que ameaça o sistema de saúde. Cada arco narrativo explora uma faceta do debate, criando um retrato complexo e holístico do impacto da crise.
Patricia Segura – A dupla batalha da presidente
A personagem de Najwa Nimri, Patricia Segura, está no olho do furacão. Como presidente da Generalitat Valenciana, é a principal promotora da privatização do Hospital Joaquín Sorolla, uma decisão que a coloca em conflito direto com a equipa médica. Ao mesmo tempo, continua a sua batalha pessoal contra um cancro da mama, o que a torna tanto a arquiteta da mudança sistémica como uma paciente dependente desse mesmo sistema. Essa dualidade encarna a contradição final da trama: a tomada de decisões no poder e as suas consequências mais íntimas. Apesar de as suas políticas colidirem frontalmente com os ideais do oncologista Néstor Moa (Borja Luna), este permanecerá ao seu lado, tecendo uma complexa dinâmica de apoio pessoal em meio a uma profunda discordância profissional e ética.
Jésica, Biel e Lluís – Um triângulo amoroso sob pressão
No plano interpessoal, a tensão materializa-se no triângulo amoroso protagonizado pela cirurgiã Jésica Donoso (Blanca Suárez). A sua trama centrar-se-á na encruzilhada sentimental de ter de tomar uma decisão final entre o diretor do hospital, Lluís Jornet (Alfonso Bassave), e o jovem e idealista interno Biel de Felipe (Manu Ríos). Este conflito não é um mero drama romântico, mas um reflexo de como as pressões extremas do ambiente hospitalar, as hierarquias de poder e o stresse constante se infiltram nas relações pessoais, exacerbando as dúvidas e magnificando as consequências de cada escolha. As decisões de Jésica, tanto na sala de cirurgia como na sua vida privada, terão um impacto direto no frágil equilíbrio de poder do hospital.
Pilar Amaro – A frente doméstica
O arco de Pilar Amaro (Aitana Sánchez-Gijón), a experiente chefe de Cirurgia, transfere o drama da saúde para o âmbito doméstico. O seu principal conflito será lidar com os problemas de vício do seu filho Óscar, uma trama já esboçada na primeira temporada e que agora será explorada em profundidade. Esta linha narrativa ilustra o custo humano e pessoal pago pelos profissionais de saúde. Demonstra que a crise não termina quando tiram a bata, mas que o esgotamento e os traumas do hospital se estendem para a vida familiar. Reflete o burnout que tanto o criador da série como o ator Alfonso Bassave apontaram como um problema real e devastador na profissão médica, onde muitos profissionais de saúde são forçados a abandonar as suas carreiras devido ao custo pessoal insustentável.
Diagnóstico Crítico: A Saúde Pública como Eixo Narrativo
Além dos dramas pessoais, a segunda temporada de “Respira” ergue-se como um contundente comentário social sobre o estado atual da saúde pública. O criador, Carlos Montero, foi explícito na sua intenção de usar a ficção como uma plataforma para “alertar e condenar” os perigos da privatização do sistema de saúde. As suas declarações revelam uma profunda preocupação com o colapso do sistema e as suas consequências tangíveis, como as falhas nos rastreios de cancro da mama, uma realidade que qualificou como “tremenda” e “horrível”.
Esta série representa uma evolução na carreira de Montero. Se em “Elite” usou o microcosmo de uma escola de elite para explorar tensões de classe e desejo através de um thriller adolescente, em “Respira” aplica uma estrutura semelhante a um contexto adulto com um propósito mais explícito e maduro. A “sensibilidade dramática e tórrida” que caracteriza o seu estilo ainda está presente, mas aqui funciona como um veículo para um debate social urgente. A série torna-se uma espécie de cavalo de Troia: atrai o público com um elenco de estrelas e a promessa de um drama romântico de alta voltagem ao estilo de “Anatomia de Grey”, para depois mergulhá-lo numa reflexão complexa sobre o futuro de um pilar fundamental do estado de bem-estar social.
A narrativa abordará de frente o esgotamento extremo dos profissionais. As observações do ator Alfonso Bassave sobre como médicos e enfermeiros abandonam a profissão devido ao “custo pessoal”, depressão e ansiedade, encontrarão eco nas tramas do Joaquín Sorolla. Além disso, a série explorará a criação de um sistema de saúde de duas velocidades. A chegada da oncologista Sophie e o debate sobre tratamentos de vanguarda servirão para ilustrar o crescente fosso entre “cidadãos de primeira classe” e aqueles que não podem aceder à inovação médica, um ponto que a própria Najwa Nimri destacou como um reflexo da realidade atual. O hospital transforma-se, assim, num campo de batalha ideológico, onde os dilemas éticos da equipa são magnificados pelas novas políticas de gestão, posicionando “Respira” como um drama com uma forte e corajosa carga de crítica social.
Ficha de Produção e Equipa Criativa
A consistência e a visão por trás de uma produção desta envergadura são sustentadas por uma equipa criativa sólida e coesa. A segunda temporada de “Respira” é um drama médico com toques de thriller que consiste em oito episódios e será exibida na Netflix. O projeto é liderado pelo seu criador e showrunner, Carlos Montero, que também atua como produtor executivo ao lado de Diego Betancor e Carlos Ruano através da sua produtora, El Desorden Crea.
A permanência de Montero e da sua equipa garante uma visão coerente e uma execução fiel à identidade da série. A equipa de argumentistas é formada pelo próprio Montero, juntamente com Carlos Ruano, Guillermo Escribano, Adela Gutiérrez e Nach Solís. Na realização, repetem David Pinillos e Marta Font, aos quais se junta a própria atriz Abril Zamora, um facto que sublinha a versatilidade do talento envolvido na produção. Essa solidez na equipa criativa é a garantia de que a nova temporada manterá a sua qualidade enquanto explora territórios narrativos mais complexos e arriscados, contando novamente com o seu elenco principal encabeçado por Najwa Nimri, Aitana Sánchez-Gijón, Blanca Suárez, Manu Ríos, Borja Luna, Alfonso Bassave, e as novas adições de Pablo Alborán e Rachel Lascar.
A Contagem Decrescente
A segunda temporada de “Respira” perfila-se como muito mais do que uma simples continuação. É uma intensificação dos dramas pessoais que cativaram o público, agora inextricavelmente ligados a uma crítica corajosa e oportuna sobre o estado do sistema de saúde. A chegada de novas e potentes personagens funcionará como catalisador de conflitos que testarão não apenas a resistência física e emocional da equipa do Joaquín Sorolla, mas também as suas convicções éticas mais profundas. A série regressa com a promessa de mais segredos, mais emoções e uma tensão narrativa que, mais uma vez, ameaça tirar o fôlego e disparar as pulsações do público.
A segunda temporada de “Respira” estreia na Netflix a 31 de outubro.
