‘O Acidente’ regressa para ajustar contas entre o luto e a vingança. Só na Netflix

O vento amainou, mas os destroços permanecem.

O Acidente
Martha O'Hara

Após um interregno que deixou os fãs atordoados com um final de cortar a respiração, milhões de subscritores da Netflix em todo o mundo preparam-se para regressar à comunidade solarenga, mas sombria, de Santa Cruz. Regressam para testemunhar as consequências de uma tragédia que começou com uma rajada de vento e terminou com uma comunidade a autodestruir-se a partir de dentro.

O Acidente (Accidente), o drama mexicano que desafiou a crítica e dominou os tops globais, está finalmente de volta para a sua segunda temporada. Se o primeiro capítulo foi um estudo sobre o trauma súbito — uma corrida frenética através das consequências imediatas da morte de três crianças num acidente com um castelo insuflável — a temporada que se avizinha promete ser um cerco psicológico em lume brando.

À medida que a estreia se aproxima, a pergunta já não é “De quem é a culpa?”, mas sim: “Poderá alguém sobreviver à penitência?”.


Um fenómeno global: anatomia de um sucesso

Para compreender o frenesim em torno do regresso da série, é preciso olhar para o sucesso caótico da sua estreia. Quando a produção foi lançada, foi comercializada como um thriller, mas o público encontrou algo muito mais híbrido e viciante.

Criada por Leonardo Padrón — a mente por detrás de Coração Marcado (Pálpito) — a série acumulou milhões de visualizações na sua semana de estreia, disparando para o Top 10 em mais de 80 países. Tocou num medo primordial dos pais e numa curiosidade mórbida para todos os outros: a ideia de que um único momento de negligência, uma fração de segundo de distração, poderia destruir uma vida.

“Foi a série do ano de que toda a gente falava, mesmo que essa conversa tenha acontecido no Twitter e no TikTok”, observa a crítica cultural Elena Vazquez. “As pessoas vieram pela premissa chocante, mas ficaram pelo desmoronamento psicológico absoluto das personagens. Era um melodrama de alto brilho disfarçado de thriller de prestígio”.

A série teve sucesso porque se recusou a desviar o olhar da fealdade do luto. Mostrou como a dor nem sempre enobrece; muitas vezes, corrompe. Famílias abastadas viraram-se contra os seus empregados, amigos traíram amigos, e a busca por “justiça” rapidamente se transformou em fome de vingança.

O cliffhanger: uma prisão feita por medida

Os novos episódios retomam a história a partir de um final que deixou os espectadores a gritar com o ecrã. Para recapitular a conclusão angustiante: Emiliano Lobo (Sebastián Martínez), o advogado cuja distração ao telemóvel foi apontada como o catalisador para o castelo insuflável levantar voo, aceitou o seu destino. Declarou-se culpado de homicídio involuntário, aceitando uma pena de prisão na tentativa de encontrar redenção espiritual.

Mas os argumentistas tinham uma reviravolta cruel reservada. Charro (Alberto Guerra), o pai enlutado e magnata local que passou a temporada inteira a tentar arruinar Emiliano, foi ultrapassado. Graças às maquinações da sua mulher abusada, Lupita (Eréndira Ibarra), Charro foi incriminado por corrupção e homicídio.

O plano final da primeira temporada — Emiliano a entrar no pátio da prisão, apenas para cruzar o olhar com Charro, que já o esperava lá dentro — preparou o terreno para um segundo ato claustrofóbico.

“A prisão do ódio e a prisão da culpa são os pontos de partida desta nova temporada. O desfecho será um choque frontal com apenas duas opções: redenção ou destruição.”

— Leonardo Padrón, Criador da série

Temporada 2: Trajetória do enredo e expectativas

Com base em fugas de informação da produção, teasers e na lógica narrativa estabelecida por Padrón, a nova temporada está pronta para expandir o âmbito para além do acidente inicial.

1. O confronto na jaula

O motor central da história que se avizinha é a dinâmica entre Emiliano e Charro. Confinados na mesma penitenciária, o equilíbrio de poder altera-se. Charro, com as suas ligações ao submundo do crime, provavelmente governa o ecossistema prisional. Emiliano, um homem da lei que perdeu o seu estatuto, entra como presa. A vertente de “thriller jurídico” provavelmente dissolver-se-á num horror de sobrevivência, já que Emiliano deve navegar num sistema onde o seu conhecimento do código penal não vale nada contra uma arma improvisada nos duches.

2. As mulheres que ficam

Enquanto os homens travam uma guerra atrás das grades, o drama mais convincente pode residir nas mulheres que ficaram em Santa Cruz.

  • Daniela (Ana Claudia Talancón): A detetive da polícia e mulher de Emiliano enfrenta um paradoxo. Cumpriu o seu dever ao deter o marido, mas agora deve criar uma família despedaçada sozinha enquanto é ostracizada pela comunidade. As primeiras críticas sugerem que Talancón entrega aqui a melhor interpretação da sua carreira, retratando uma mulher a endurecer o coração para sobreviver.
  • Lupita (Eréndira Ibarra): A “Lady Macbeth” da série. Tendo incriminado com sucesso o seu marido Charro para escapar aos seus abusos, ela é agora a guardiã do segredo mais perigoso da trama. Se Charro descobrir que ela foi a arquiteta da sua queda, a sua vingança chegará muito para além dos muros da prisão.

3. A conspiração empresarial

O “acidente” nunca foi apenas sobre o vento. A primeira temporada tocou num acordo de construção corrupto que envolvia um parque de diversões no qual as famílias tinham investido. Espera-se que os novos episódios puxem esse fio com mais força. Com os principais intervenientes distraídos ou encarcerados, novos antagonistas — talvez parceiros empresariais ou figuras políticas — provavelmente surgirão para se apoderarem dos bens das famílias Lobo e Pereira.

A “Fórmula Padrón”: Porque funciona

Porque somos tão obcecados por O Acidente? A resposta reside no tom específico que Leonardo Padrón domina. Os críticos chamaram-lhe “Telenovela de Prestígio”.

A série possui os elevados valores de produção, a cinematografia e o calibre de representação de dramas da HBO ou da BBC. As filmagens em locais que lembram Tepoztlán oferecem um cenário exuberante e visualmente deslumbrante que contrasta fortemente com a decadência moral das personagens.

No entanto, o ritmo e as reviravoltas da trama são pura telenovela. Os fãs recordam-se de maçãs envenenadas, gravidezes surpresa, artefactos arqueológicos enterrados usados como chantagem e assassinos disfarçados de estafetas. É uma realidade onde a Lei de Murphy é a única lei: tudo o que pode correr mal, vai correr mal, geralmente da maneira mais dramática possível.

“É sem remorsos”, diz o historiador de TV Marco Solis. “Os dramas americanos tentam muitas vezes ser demasiado subtis. Os dramas mexicanos como O Acidente compreendem que o luto é confuso, barulhento e irracional. Padrón escreve personagens que tomam decisões terríveis porque estão cegas pela emoção. É frustrante de ver, mas impossível de largar.”

Temas de classe e corrupção

Sob as reviravoltas, a série parece pronta para oferecer uma crítica mais aguçada ao sistema de justiça mexicano.

Anteriormente, a tragédia agiu como um grande equalizador — a morte não queria saber do tamanho da conta bancária. No entanto, as consequências destacaram a disparidade. As personagens abastadas podiam pagar a melhores advogados, detetives privados e subornos.

Com Emiliano e Charro agora na prisão, a série explora um tipo diferente de nivelamento. Nas celas, as estratificações sociais são apagadas, substituídas por uma hierarquia brutal de força física. A série coloca questões desconfortáveis: a prisão reabilita realmente ou apenas incuba mais ódio? Um homem como Charro, que acredita estar acima da lei, pode ser quebrado por ela?

Além disso, a personagem Moncho (Silverio Palacios), o trabalhador doméstico cuja família foi dizimada pelo acidente e pela violência subsequente, permanece como a ferida moral da série. A sua linha narrativa servirá provavelmente como o contraponto trágico às disputas das famílias ricas — um lembrete de quem realmente paga o preço mais alto quando os ricos brincam aos deuses.

Bastidores da produção e elenco

A Netflix manteve um sigilo rigoroso sobre a produção, que foi filmada consecutivamente com a primeira temporada para garantir a continuidade e um lançamento rápido. A equipa de realização formada por Gracia Querejeta e Carlos Villegas regressa, mantendo o estilo visual que favorece grandes planos claustrofóbicos e cores dessaturadas durante momentos de alta tensão.

O elenco continua a ser o maior trunfo da série:

  • Alberto Guerra mantém a sua sequência de domínio do ecrã. Após a sua aclamação em Griselda, a sua interpretação de Charro é aterrorizante porque está enraizada numa dor genuína. Ele não é um vilão de banda desenhada; é um pai levado à loucura pela perda.
  • Sebastián Martínez traz uma vulnerabilidade necessária a Emiliano. Ele é o substituto do público — o homem imperfeito a tentar fazer a coisa certa num mundo que pune a honestidade.
  • Regina Blandón, que interpreta a jornalista, deverá ter um papel expandido, atuando potencialmente como o veículo através do qual o mundo exterior descobre a corrupção em Santa Cruz.

O veredicto: contagem decrescente para a colisão

O burburinho é palpável. As redes sociais estão cheias de teorias. Conseguirá Charro escapar? Irá Emiliano morrer? A verdadeira causa do acidente — foi realmente apenas o vento ou houve sabotagem? — será finalmente revelada?

O Acidente não é apenas um programa de televisão; é um espelho das nossas ansiedades sobre o controlo. Construímos vedações, assinamos contratos, contratamos segurança, mas não podemos parar o vento.

Para os habitantes de Santa Cruz, o vento parou, mas a tempestade está apenas a começar.


Informações de lançamento

A 2.ª temporada de O Acidente estreia globalmente na Netflix na quarta-feira, 10 de dezembro de 2025.


Em resumo: O que precisa de saber

CaracterísticaDetalhes
Data de Lançamento10 de Dezembro de 2025
PlataformaNetflix (Global)
CriadorLeonardo Padrón
Elenco PrincipalAna Claudia Talancón, Sebastián Martínez, Alberto Guerra, Eréndira Ibarra
GéneroDrama, Thriller, Suspense
Resumo da T1Um acidente com um castelo insuflável mata 3 crianças; batalhas judiciais sucedem-se; termina com protagonista e antagonista na mesma prisão.
Gancho da T2Sobrevivência na prisão, planos de vingança e a revelação dos segredos dos sobreviventes.

Netflix

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